Na última década foi possível testemunhar um movimento transformador na indústria da construção, à medida que as mulheres ganham espaço e influência em um setor tradicionalmente dominado por homens. A inclusão produtiva de mulheres na construção civil não é apenas uma questão de igualdade de gênero, mas também uma estratégia inteligente para impulsionar a inovação e promover ambientes de trabalho mais diversos e inclusivos.
No último painel da Comissão de Responsabilidade Social durante o evento Construa Maranhão, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) trouxe à tona a relevante discussão sobre a inclusão produtiva das mulheres na indústria da construção. A respeito do tema, a vice-presidente da área de Responsabilidade Social da CBIC, Ana Cláudia Gomes, provocou reflexões sobre os desafios enfrentados pelas mulheres nesse setor.
“O ENEM desse ano foi sobre a economia do cuidado, porque é delegado à mulher esse espaço e esse compromisso de ser a responsável por cuidar das famílias, das pessoas, e o quanto isso nunca foi valorizado, respeitado e visto como um trabalho”, destacou Gomes, sublinhando a complexidade da dualidade de papéis assumidos pelas mulheres na sociedade.
Gomes ressaltou que, apesar do progresso educacional e da ascensão profissional das mulheres, elas continuam a enfrentar o desafio de conciliar suas carreiras com as responsabilidades tradicionalmente atribuídas a elas no ambiente doméstico. “Em algumas famílias esse papel vem se transformando, a gente vê maridos e pais agindo de forma diferente. Então tem todo um desafio de um contexto histórico de muitos anos que é assim e que está posto”, observou a vice-presidente.
Nesse cenário desafiador, Ana Cláudia Gomes provocou uma reflexão crucial: “Olhando para todo esse contexto, qual é o maior desafio hoje para a gente avançar, por mais que já tenhamos avançado, mas o que hoje ainda impede da gente caminhar a passos mais largos para que as mulheres cheguem a cargos mais estratégicos? O que falta para essa transformação?”.
Gracia Fragala, assistente social, sócia na TPA Saúde e consultora no projeto Elas Constroem da CRS/CBIC, complementou a discussão abordando fatores históricos, sociais, culturais e individuais que contribuem para a persistência das disparidades de gênero na indústria da construção.
“A gente tem uma tradição em que homens e mulheres sempre trabalharam juntos, só que na divisão social do trabalho, ficou como papel da mulher a esfera do privado, que quer dizer que a mulher ficou com essa parte oculta, essa parte do cuidado, essa parte da porta para dentro, e o homem ficou com a esfera do público”, esclareceu Fragala, apontando para a raiz histórica das desigualdades de gênero no ambiente profissional.
Ao citar o exemplo pessoal de seus avós, que gerenciavam uma empresa de calçados, Fragala evidenciou a perpetuação desses padrões ao longo das gerações. “Então isso vai passando de geração em geração, as mulheres na esfera privada e os homens na esfera pública. E essa coisa do cuidado ficava para as mulheres”, afirmou.
A consultora ressaltou a importância de conscientizar as mulheres sobre a necessidade de uma abordagem colaborativa na busca pela equidade de gênero. “É preciso que a gente faça as mulheres entenderem o seguinte: essa equidade se conquista junto. Não somos nós contra os homens ou vice-versa, somos nós juntos construindo um caminho diferente e é isso que tenho feito na minha carreira”, concluiu Fragala.
Também presente no debate, Elissandra Candido Alves Silva, presidente do Sinduscon Sul Fluminense, destacou a importância de enfrentar os desafios dentro do setor. ”A gente está diariamente enfrentando desafios e quando a gente se posiciona sobre quem a gente é, a gente evolui”, afirmou a dirigente, ressaltando a importância da autenticidade e da afirmação de identidade para o crescimento individual e coletivo. A presidente enfatizou que a evolução está intrinsecamente ligada ao reconhecimento e enfrentamento dos desafios presentes na trajetória das mulheres na construção.
Silva também destacou o papel essencial da rede de apoio nos bastidores. “Essa rede que nos ajuda para gente conseguir evoluir. E quando você tem essa rede de apoio elas te empurram para frente, porque você vira inspiração para elas”, disse Elissandra.
Para ela, o debate sobre o tema reflete a importância de criar uma comunidade solidária e inspiradora, fundamental para superar os obstáculos no ambiente de trabalho. “A ideia de que cada conquista individual serve como um farol para guiar outras mulheres é uma poderosa mensagem de solidariedade e crescimento coletivo”, finalizou.
A temática ganhou contornos mais práticos com a intervenção de Kellen Kalli, CEO da MEMPS Estruturas Metálicas. Kellen trouxe à tona o desafio adicional enfrentado pelas mulheres em um ambiente majoritariamente masculino, especialmente nas esferas executivas das empresas.
“É desafiador tudo isso. De fato são muitos desafios. E dentro da minha empresa, a gente tenta criar esse espaço seguro, onde as pessoas possam ser ouvidas e isso acaba engajando as pessoas por propósito.”
Trazendo a questão do conflito entre as gerações, Kellen destacou a importância de criar ambientes inclusivos e de valorizar o propósito individual dos colaboradores. “E a nova geração se engaja por propósito, então, a gente tem que abrir o espaço em que o propósito da nossa empresa se encontre lugar nos propósitos individuais das pessoas. E os propósitos fazem com que a gente caminhe melhor”, pontuou Kellen.
Regina Dias Vieira, gestora de Projetos do Sebrae-MA, destacou a participação ativa das mulheres nas capacitações no Maranhão. “Em relação às capacitações que temos, as mulheres sempre estão em maior número nas capacitações aqui no Maranhão”, enfatizou. Para ela, isso sugere um interesse crescente e uma disposição para superar barreiras por parte das mulheres que buscam entrar ou progredir na indústria da construção.
Ainda durante o debate, Luciana Soares Jacinto, coordenadora do Programa Mulher do Maranhão, enfatizou o potencial transformador da presença feminina no setor. “O diferencial entre os homens e as mulheres é para melhor. E as pessoas precisam entender que não estamos lutando para tomar o lugar do homem, o que nós queremos é igualdade. A gente está lutando pela equidade de gênero: onde o homem estiver, nós podemos estar também. A gente pode estar em qualquer lugar”, disse.
Luciana revelou a visão ambiciosa do Programa Mulher do Maranhão: “O nosso objetivo principal é que até 2030 todas as áreas tenham 50% de homens e 50% de mulheres”, explicou. Para ela, esse objetivo reflete não apenas a busca por números equitativos, mas a aspiração de criar um ambiente onde as mulheres se sintam valorizadas e ocupem seus espaços de direito em todos os níveis e setores da indústria da construção.
O Construa Maranhão foi uma realização conjunta da CBIC e do Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado do Maranhão (Sinduscon-MA), com a correalização do Sesi e do Senai Nacional e patrocínio da Softplan, Confea e Mútua. O evento ocorreu nos dias 9 e 10/11 junto à 5ª edição da Expo Indústria Maranhão, já consolidada como a maior feira multisetorial do Nordeste.
O tema tratado tem interface com o projeto “Responsabilidade Social na Indústria da Construção”, da Comissão de Responsabilidade Social (CRS) da CBIC, com a correalização do Serviço Social da Indústria (Sesi Nacional).
Fonte: CBIC